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domingo, 15 de outubro de 2017

O DIREITO DE SER “ÍNDIO”

A canção “Sangue Latino”, umas das mais marcantes composições da icônica banda brasileira Secos e Molhados, ilustra bem a pesarosa realidade vivida pelos povos deste subcontinente, em particular a árdua condição de ser índio. Desde que os europeus chegaram ao continente americano, os povos indígenas foram lançados à luta pela sua sobrevivência, física e cultural, sendo sempre tratados como inferiores, pensamento esse que ainda persiste, gerando estereótipos e preconceitos que prevalecem na mentalidade grande parte da população.

Quando aqui se estabeleceram, os portugueses logo recorreram à mão de obra dos povos nativos. O indígena, não inserido na lógica mercantilista do colonizador, passou a ser visto como “preguiçoso” e “ineficiente” pois não compreendia o exercício do trabalho como acúmulo de riqueza e sim como atividade necessária para a sua sobrevivência (caçar, pescar, plantar, coletar, etc.) A ideia do “índio ocioso e vadio” ainda é muito comum na nossa sociedade, a tal ponto da muitas pessoas afirmarem que os índios são “sustentados” pelo Estado, pois este lhes provê uma série de “privilégios”, como a demarcação de terras. Tal afirmação, que soa minimamente absurda, contraria todos os princípios indígenas de resistência e autonomia. As demarcações de terra são nada mais que o reconhecimento de uma posse territorial milenar, usurpada pelos colonizadores e posteriormente pelos agropecuários, sendo uma legítima reparação de uma dívida histórica para com a coletividade indígena, assim como as cotas étnicas.   

 Um estereótipo muito comum é a ideia de encarar os índios como um povo homogêneo. Levar tal proposição em consideração é alarmante pois significa desprezar uma pluralidade de culturas que abrange mais de 300 idiomas, que carregam diversas tradições e conhecimentos e riquíssimas expressões artísticas. Muito comum também é a noção de “desindigenização”: muitas pessoas argumentam que os índios “estão deixando de sê-lo” pois já não vivem mais como os seus antepassados, falam português, possuem acesso à tecnologia e ingressam nas universidade. Ora, todos podemos evoluir. Por que negar ao indígena esse direito? Ainda possuímos a arcaica visão de que um índio para se assumir como tal necessita adotar o estilo de vida pré-colombiano, o que é uma grande falácia.

 A perseverança da ideia que a sociedade indígena é ultrapassada e retrógada, enclausurada em si mesma, leva a malfadada ideia de que os povos indígenas não podem contribuir para a sociedade. A afirmação é refutada pela nossa própria vivência cotidiana na qual constatamos a influência indígena em diversos aspectos, como na alimentação (comemos milho, mandioca, peixe, etc.), nos hábitos (dormirmos na rede) e na língua (muitas palavras possuem origem indígena). Muitos conhecimentos, sobre doenças, ervas medicinais, plantas, animais, geologia, clima, entre outros estão presentes nas tradições dos povos nativos. Belíssimas histórias, poemas e epopeias estão presentes nas centenas de línguas. Tudo isso demonstram o precioso legado indígena à sociedade brasileira, o que não exime os índios de contribuírem ainda mais para o desenvolvimento do nosso país, provando que estes não constituem uma civilização “inferior”.

  Inegável é a importância do indígena na formação e desenvolvimento do povo brasileiro. Durante séculos, este foi marginalizado pelo Estado e pela sociedade, constituindo uma das minorias que mais sofreram com a indiferença do poder público e o preconceito generalizado na sociedade, dificuldades que ainda enfrentam. É imprescindível que se realce a positiva influência do índio no nosso país, retificando assim a distorcida visão sobre a cultura indígena fomentada desde a colonização, em que o índio vem lutando pelo direito de “ser” índio. Reconhecer a multiculturalidade do Brasil é reconhecer que o povo brasileiro é uno na diversidade.   

O texto é de Pedro Duarte Costa 
Aluno do 2º ano de Eletrotécnica do IFRN - Campus Mossoró. 

   

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