Final do século XVIII anos
iniciais do século XIX, tempo conturbado na Vila de Portalegre, sede da Ribeira
do Apodi, onde índios Tapuia Paiacu foram aldeados, desde 1761. Neste mesmo
momento, dois movimentos importantes que estavam acontecendo e que estimulavam
conflitos na região: a Revolução Republicana de 1817 e a Confederação do
Equador. Por motivos de conflitos, alguns dos moradores da vila já haviam sido presos.
Um desses casos foi o do Coronel José Francisco Vieira de Barros. Quem cita o cenário
é José Sávio Lopes (2017) em seu romance histórico Dezessete. Ele se refere à época de forma descontraída que essa
revolução também ficou conhecida como: Revolução Pernambucana ou Revolta dos
Padres.
Tal Revolução teve como principal
fim criar, no Norte do Brasil, uma república livre do domínio Português, tendo
o dia 06 de março de 1817, ocorrido no Forte das Cinco Pontas, “quando o Leão
Coroado reagiu à voz de prisão e matou a golpes de espada o seu comandante,
Brigadeiro Manoel Joaquim Barbosa de Castro” (LOPES, 2017, p. 29). Tal
revolução foi liderada por André de Albuquerque Maranhão e apoiada por alguns
representantes da igreja e das milícias da Ribeira do Apodi, em especial das
vilas de Portalegre, Patu, Apodi e Martins.
Como se tratava de uma revolução contra
as execuções portuguesas e no momento os índios estavam insatisfeitos porque a
Câmara de Vereadores lhes atribuiu terras improdutivas, situadas nas grutas e
que não serviam para o cultivo da lavoura, certamente foram influenciados por
esse momento de tensão. Segundo Morais (2005), naquele momento a população de
índios era bem maior do que a de brancos na Vila de Portalegre. E quem traz informações
sobre esse detalhe é Macedo (2002) com informações sobre os números de brancos,
pardos, pretos, mulatos e índios daquele lugar no ano de 1805. Ao todo, no
início de do século XIX 1017 moradores na Vila de Portalegre. Desse total, 262
eram brancos; 100 pretos, 255 mulatos e 400 índios.
Nonato Mota (s/d) é quem relata
em seu manuscrito, a volta do Coronel Vieira de Barros. Segundo o texto, este
chegou a Portalegre logo que saiu da prisão e encontrou a vila em estado
anarquista. Os vereadores tinham tomado as terras improdutivas dos índios e
tinham queimado suas casas, feitas de palha, por isso chamadas de “palhoças”. Além
de ficarem sem terras e casas, alguns indígenas foram presos. Vieira de Barros,
ao ver a situação, pensando em apaziguar, aforou alguns terrenos aos índios mais
exaltados, porém nada disso adiantou.
As influências recebidas das
revoluções já citadas e outros conflitos envolvendo índios e colonizadores em
outros lugares do Brasil prevaleciam. Segundo Trindade (2010) foi justamente no
sertão do Nordeste atual se iniciaram manifestações contra algumas das
determinações do imperador D. Pedro I. Pernambuco foi cenário do primeiro
movimento liderado por Frei Caneca em protesto ao autoritarismo do imperador,
que havia fechado a Assembleia Constituinte, impondo outras leis que lhes davam
poderes excepcionais. Os povos envolvidos queriam a independência e um governo
republicano por parte dos liberais, mas, os grandes proprietários estavam
insatisfeitos com os altos impostos.
Enfim, não há como negar o contexto
de revolução que influenciava também as relações entre os índios aldeados e os
colonos. E este fator foi primordial para que ocorresse um dos massacres mais
sangrentos da história dos conflitos envolvendo portugueses e indígenas do
Oeste Potiguar no tempo da colonização, sendo o cenário do episódio a Serra de
Portalegre. Tudo aconteceu depois de um ataque indígena aos moradores da Vila
de Portalegre. Segundo Mota (1920), os índios invadiram a vila sob a liderança
de Luiza Cantofa e João do Pêga. Travaram luta com os moradores e o delegado de
polícia, o Capitão Bento Ignacio de Bessa foi morto. O Coronel Vieira de Barros
se suicidou e os índios, em sua grande maioria foram presos e algemados na
cadeia da vila.
Passaram alguns dias, mas, já
sabendo que seriam levados em escolta à cidade de Natal para lá ficarem
definitivamente presos. Nonato Mota (s/d) ao relatar os fatos que ocorreram,
diz que no dia 03 de novembro de 1825, “ao chegarem ao pé da serra, entre o
sítio Viçosa e a Vila de Port’ Alegre, levantaram uma grande cruz, e depois de
rezarem um terço, foram os presos passados pelas armas [...]” (MOTA, s/d, p.
65). Dezenas de índios foram assassinados. As notas históricas falam de 70
índios, porém, é possível inferir que pela sua dimensão e por falta de
documentos que comprovem de fato as perdas da parte dos índios, esse
quantitativo pode ter sido bem maior. Após o fato, os relatos indicam que os
principais autores dessa chacina nada pagaram pelo crime. Foram eles: Antônio
Bezerra, Florêncio de Albuquerque, Antônio Caboba e Joaquim Cavalcante. Os
índios sobreviventes do confronto foram retirados com suas famílias para os
centros dos Cariris no Estado do Ceará, não mais tendo voltado ao sertão do Rio
Grande do Norte (MOTA, s/d).
Luiza Cantofa, a velha índia que
vivia com sua neta Jandi na vila conseguiu escapar do massacre e se esconder na
Serra por alguns dias. No entanto, moradores deram conta de seu esconderijo, o
que fez com que seus algozes a encontrassem no topo da serra de Portalegre e
ali mesmo ela fosse morta na frente da neta, com uma punhalada no peito. Jandi
nunca mais foi vista, João do Pêga também fugiu e não mais foi visto. E hoje,
resta apenas a memória histórica fixada na cidade de Portalegre: na Casa de Câmara e Cadeira (Museu Histórico), no terminal
turístico da Bica e na cova de Cantofa, no alto da Serra.
Por Mônica Freitas
Texto com base na Dissertação de
Mestrado de sua autoria.
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