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quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

MUSEU LUIZA CANTOFA: ENTRE O AQUI E O ACOLÁ



O Museu Luiza Cantofa é uma entidade cultural ligada à associação do Centro Histórico Cultural Tapuias Paiacus da Lagoa do Apodi (CHCTPLA), que prioriza como finalidade não somente o resgate histórico do poco Tapuia Paiacu de Apodi, mas a reconstrução e reelaboração da cultura deste povo pré-colombiano, presente no Território Pody, posteriormente chamado Ribeira do Apodi, quando requerida e recortada como terras a serem colonizadas na segunda metade do século XVII por Manuel Nogueira Ferreira e seus familiares enviados pela Coroa Portuguesa para fins do capitaneamento hereditário. 

O CHCTPLA é formado apenas por famílias que tenham histórico de pertencimento indígena, ou seja, famílias que relatem a ascendência (parentesco genealógico) com os primeiros habitantes de Apodi, o que garante o direito à autoafirmação disposto em diversos códigos legais, desde à Constituição Federal  e convenções internacionais, como a Convenção 169 da OIT ao Estatuto do Índio. Na convenção 169 é o artigo 1º que fundamenta o direito à auto-identificação quando diz que considerados indígenas os povos que vivem em


países independentes e descenderem de populações que viviam no país ou região geográfica na qual o país estava inserido no momento da sua conquista ou colonização ou do estabelecimento de suas fronteiras atuais e que, independente de sua condição jurídica, mantêm algumas de suas próprias instituições sociais, econômicas, culturais e políticas” (OIT, 2005, art. 1º).

É sabido por todos os apodienses que a história indígena deste município é muito forte, carregada de fatos que incluem desde conflitos pequenos a massacres mais sangrentos como o ocorrido em 1825, quando índios Tapuia Paiacu que tinham sido levados de Apodi a Portalegre se envolveram em uma revolta e por isto foram presos, posteriormente mortos em um massacre ao pé da serra, onde hoje está situado o município de Viçosa. Fato este que também contribuiu para o silêncio de algumas famílias que permaneceram em Portalegre e outras de Apodi sobre as relações de pertencimento à antiga tribo Tapuia Paiacu. De lá para cá, o medo deu margem à chamada "miscigenação" como negros e com brancos, base fundamental da formação do nosso povo. No entanto, alguns ascendentes atuais resistem em se autodeclarar pertencente ao povo Paiacu pelo fato de já conhecerem os aparatos legais que fundamentam a auto-afirmação e por terem realmente relato de histórico familiar da ascendência. 

Nesse contexto de busca pela representação étnica, fundado por Lúcia Tavaris, também de ascendência indígena e hoje liderança do povo Paiacu, o Museu Luiza Cantofa abriga peças líticas que eram guardadas pelas famílias que se agregaram ao CHCTPLA. Muitas tinham peças preservadas há séculos, passando de um membro a outro da família, hoje essas peças são parte do acervo do primeiro museu indígena do Rio Grande do Norte, que carrega o nome da índia Cantofa, uma das líderes, junto com João do Pêga da revolta ocorrida em 1825 em Portalegre. 

O referido museu, desde 2013, quando foi fundado por Lúcia Paiacu, como é conhecida, tem um  bom histórico de visitação por algumas escolas de Apodi e da região, tanto públicas quanto privadas, bem como de nível federal, estadual e municipal. As instituições de ensino superior como UFERSA, UERN, entre outras também já passaram pelo museu, que mesmo sendo uma entidade sem fins lucrativos costuma cobrar uma taxa básica para a visitação, visto a necessidade manutenção.  Entre os visitantes estão também museólogos de diversas partes do Brasil e também do exterior. 

Atualmente o museu foi desativado, as peças foram retiradas das prateleiras, pois, por não ter uma sede adequada, já que funcionava na sala da casa de Lúcia Paiacu, uma peça de imensurável valor histórico foi furtada do acervo. Esse fato contribuiu para a desativação, sendo mantido apenas a sede do CHCTPLA no mesmo endereço.  


Neste dia 23 de janeiro, terça-feira, estiveram visitando o Centro Histórico alguns museólogos e pessoas envolvidas com a organização de museológica na Itália.  Marco Tonon( museólogo) e diretor de museu da Itália, Loredana Caniglia, scienze Naturali, Graziella Perin e Guerrino Rossi (fotógrafo e corista). Eles queriam ver de perto o local que guarda a história dos primeiros povos do Sertão do Rio Grande do Norte. Além de visitar e conhecer um pouco da história que está no acervo do Museu Luiza Cantofa, os italianos quiseram saber mais sobre Apodi e foram levados por Isaac Torres que é Turismólogo colaborador do CHCTPLA e Lúcia Paiacu a fazer um City tour pela cidade passando pela Igreja Matriz, Lagoa do Apodi e Missão 1, Balneário da Lagoa e pra finalizar foram ao prédio que está sendo preparado para abrigar o Museu do Índio Luiza Cantofa, situado às margens da Lagoa do Apodi, próximo ao balneário. 


Fotos extraídas do Facebook de Lúcia Maria Tavares. 
Os italianos, assim como tantos outros visitantes do acervo indígena apodiense, entre os quais estão museólogos, professores universitários, arqueólogos e antropólogos são taxativos em afirmar a importância das peças guardadas pelo povo Paiacu. São de raridade imensurável e deveriam ter maior atenção do povo apodiense, mesmo os que não se autodeclaram ascendentes indígenas. O fato é que, mesmo já tendo escutado essas afirmações tantas vezes, o que se observa é o distanciamento dessa história da nossa sociedade. 

Há um certo desprezo pela história e esse comportamento é confirmado por algumas pessoas que com toda a sinceridade afirmam: "Essa história não interessa a ninguém, quem diz que tem interesse está sendo hipócrita". São as frases mais escutadas, às vezes lidas em comentários em redes sociais. E como comprovação desse "desleixo" estão inclusas as próprias atitudes políticas de quem ocupa o poder público. E quanto a isto não é necessário nomear ninguém, já que o histórico de abandono é de tão longo tempo que se faz inviável a identificação. Além disso, a perseguição aos que estão envolvidos na causa pela reelaboração da história, da cultura, dos costumes, que é um direito garantido na Constituição já é visível. E tudo pelos mesmo motivos de 190 anos atrás. 

Por isso, dizemos que o Museu Luiza Cantofa está entre o aqui e o acolá; o aqui da nossa história que ninguém mais pode apagar, ao ponto de Apodi ser denominada "Terras dos Tapuias Paiacus" e acolá por ser uma história com forte pressão para o esquecimento, com o apoio político e da sociedade, quando se trata de aceitar a auto-identificação dos que não negam as suas raízes. 

Por Mônica Freitas


sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

(HISTÓRIA NEGRA) QUEM FOI SARAH BAARTMAN?


Imagem extraída de
 https://www.facebook.com/desmentindoahistoriabranca/photos/rpp.570638413391972/613329192456227/?type=3&theater

TODAS AS MULHERES NEGRAS AINDA SÃO VISTAS COMO SARAH BAARTMAN.
Quem?
Também conhecida como Saartjie, Vênus Negra, Vênus Hotentote…
Nada ainda? Nunca ouviu falar? Então mesmo esqueminha de sempre, senta aí que a gente conversa.
Sarah nasceu em 1789 na região da Africa do Sul, perdeu os pais muito cedo, e aos 10 anos de idade foi trabalhar em uma fazenda holandesa fazendo serviços domésticos.
Chamou a atenção dos patrões por suas FORMAS ”INUSITADAS’’ e ‘’ANORMAIS” (percebam que nesta época a medida do mundo era dada pelo homem branco europeu, tudo que fugia disso era considerado desumano e anormal.
Quer dizer..era? Ou ainda é?
Prometeram leva-la para a Inglaterra, para se tornar uma ARTISTA que ficaria rica, e ela mesmo analfabeta SUPOSTAMENTE assinou um contrato.
Mas o que fizeram da vida breve dessa mulher foi desumano. 
Não existe outra palavra para descrever o que aconteceu. 
Ela se apresentava com uma roupa colada da cor de sua pele, fumando um cachimbo, e a história contada para o público era a de uma selvagem que foi capturada e domada.

Ela era ensaiada a emitir BARULHOS ANIMALESCOS e fingir que iria ATACAR OS BRANC’OS da platéia.
Usava uma COLEIRA e as pessoas que pagavam um dinheiro extra podiam tocar em suas nádegas avantajadas.
Sarah não queria ter que exibir seus órgãos genitais. Mas ao ser vendida para um novo ‘’dono’’ que era muito mais duro com ela, foi obrigada a se exibir totalmente nua, inclusive em festas noturnas onde HOMENS BÊBADOS se DIVERTIAM APALPANDO o seu corpo.
O racismo ”cientifico” estava em seu auge, logo o corpo de Sarah despertou interesse e curiosidade nos estudiosos da época.
Ela chegou a ser ‘ESTUDADA’ ainda em vida, era MEDIDA, CUTUCADA, APALPADA e constantemente COMPARADA com ORANGOTANGOS.
Começou a BEBER e FUMAR com muita INTENSIDADE para SUPORTAR estas apresentações TORTURANTES.
No entanto um grupo de ativistas da época ficou horrorizado com a forma como ela era tratada e iniciou um processo judicial contra os ‘empresários’ dela.
Mesmo assim Sarah os defendeu e afirmou receber metade do lucro do que eles faturavam, e mesmo que provavelmente estivesse sendo COAGIDA, o processo foi arquivado, afinal era APENAS UMA NEGRA.
Por motivos políticos, as apresentações se tornaram impossíveis, e Saartjie foi levada a se PROSTITUIR e tornou-se alcoólatra.
FALECEU aos 26 ANOS DE IDADE, (provavelmente) de sífilis.
Enfim descansou, e deixaram o corpo dela em paz né?

Claro que não!
Um naturalista fez um molde do corpo, antes de dissecá-la. Ele foi usado para definir uma fronteira entre a MULHER BRANCA ‘NORMAL’ e a MULHER AFRICANA ‘ANORMAL’.
Foram preservados o cérebro e os genitais que depois seriam expostos por muito tempo.
Até 1974 faziam parte do acervo público da França, sendo o ÓRGÃO GENITAL dela exibido ao lado do CÉREBRO de grandes homens pensadores, como Descartes.
Eu não destaquei essas duas palavras sem motivo.
Se vc já entendeu é isso mesmo! Caso contrário vou explicar:
O HOMEM BRANCO e a MULHER NEGRA seriam os DOIS EXTREMOS da humanidade, ele sendo representado pelo CÉREBRO, um ser RACIONAL, capaz de produzir o saber, e ela sendo representada pela VAGINA, um ser SEXUAL, e primitivo.
Várias tentativas foram feitas para se resgatar os restos mortais de Sarah e devolver ao continente africano para um enterro digno. 
Em 1994 o então presidente da África do Sul, Nelson Mandela mais uma vez fez o pedido ao governo francês, e somente em 2002 a solicitação foi atendida (demorou porque os caras de pau entraram na justiça para não devolver), assim 192 anos depois ela retorna ao lar, e é enterrada humanamente.

Depois de saber, que a objetificação sexual do corpo negro é histórica, que a suposta falta de aptidão intelectual das pessoas negras vem de muito longe ainda hoje esse estereótipo continua. 
Todas as vezes que dizem estar exaltando a mulher negra, colocam fotos de mulheres de costas, focando apenas em nádegas avantajadas

A crítica não é baseada no puritanismo, (cada um exibe o que quer e não há problema nenhum nisso) e sim na DINÂMICA SOCIAL que continua a mesma.
As mulheres negras são vistas como seres sexuais incapazes de produzir conhecimento, e de liderar. E quando isso acontece, são frequentemente questionadas e invisibilizadas.
Tudo isso fruto da falsa superioridade racial da branquitude e do pensamento colonizador.
Mulher negra não é só bunda!
Ela é avó, mãe, irmã, filha e esposa.
É chefe de família, advogada, engenheira e médica.
É empreendedora, professora, enfermeira, atriz e cantora.
É chef de cozinha, atleta, escritora, maquiadora e artesã.

Ela é tudo isso e muito mais. Ela é o início. O ventre que fecunda desde o princípio.
Sarah Baartman não teve justiça em vida. Mas ela vive em cada mulher negra que possui consciência da história de seu povo e desafia o sistema todos os dias para manter os seus e a si própria em pé.


Reedição e adaptação do texto de Alessandra Eduardo